
(Palavras menores
para modelos maiores)
A palavra
surge
comove
fascina
inventa
o símbolo
a crença
A palavra
vive
no escritor
no livro
no leitor
A palavra
é o modelo
é o anti-modelo
é obra inacabada
é tinta derramada
do coração de Natália
do olhar de Manuel
do pensamento de Saraiva
A palavra
é o que resta
num mundo que gira
cada vez mais depressa
é o que fica de ti
quando partes
quando Vivaldi regressa
nas andorinhas da tua infância
A palavra
é o que fica
quando o coração se cansa
e o gesto se apaga
é o sémen que fecunda
a memória das vidas interrompidas
Escrevi e publiquei este poema em homenagem a Natália Correia, Manuel da Fonseca e António José Saraiva em 1993, ano em que partiram destas terras e se entregaram a outros voos.
Tive a sorte de falar com a Natália algumas noites no seu bar “O Botequim”.
Manuel da Fonseca foi o primeiro escritor com quem dialoguei, há muitos muitos anos, numa aula de Língua Portuguesa de 9ºano, onde com a sua doçura conseguiu cativar os alunos para a sua escrita.
António José Saraiva vestia um sorriso simpático nos corredores da Faculdade de Letras de Lisboa e encantava todos aqueles que assistiam às suas intervenções em encontros sobre literatura.
Fica sempre em nós a lembrança daqueles que, de uma ou outra forma, se cruzam connosco e nos dizem alguma frase que permanece.
Vivaldi desde cedo habitou os meus silêncios.
A pintura é de Matisse e evoca memórias de sonho e liberdade.
Carla Augusto